segunda-feira, 28 de abril de 2014

O que você está fazendo aqui?

Quando se passava no vestibular da década de 70 ou 80 do século passado (século XX) era uma verdadeira festa. Os aprovados tinham as cabeças raspadas (às vezes os amigos e parentes providenciavam o corte do cabelo mesmo contra a vontade do aprovado). Muitos faziam festas comemorando o acontecido. Claro que só os mais abastados davam festas para comemorar tal acontecimento, até por que a aprovação dos menos abastados era acontecimento muito raro, mas que sempre aconteciam.

A relação dos alunos aprovados no vestibular, natural de Itabaiana, era divulgada nas rádios e era motivo de orgulho da população local. Chamava à atenção a quantidade de pessoas aprovadas no vestibular proveniente de uma cidade pequena! É sempre bom lembrar que eram mencionados somente os nascidos na cidade de Itabaiana, por que se fossem relacionados os aprovados no vestibular dos estudantes oriundos do Colégio Estadual Murilo Braga a quantidade de aprovados eram bem maiores. Isso ocorria pelo fato do CEMB ter uma clientela proveniente não somente de Itabaiana e atendia a todas as cidades vizinhas ao município.
Justamente na década de 70, do século XX, foi retirado a figura do Concurso da Admissão para ingressar no chamado Curso Ginasial, alias, foi retirado a admissão e o Curso Ginasial juntamente com o Curso Primário passam a se chamar Primeiro Grau e Posteriormente Ensino Básico. Por causa dessas mudanças, todas as pessoas passaram a ter acesso o livre as Escolas Públicas sem distinção de classe social, credo e cor. Como resultado, as pessoas, das chamadas Classe média, passaram a colocarem os filhos para estudarem nas chamadas Escolas Particulares.

Desde que estudava o Ginasial, eu sempre sonhava em ser professor de Geografia e, por ocasião da finalização do segundo grau, fiz o vestibular para o Curso de Licenciatura Plena-Geografia. Não fui aprovado na primeira tentativa, afinal de contas para um aluno que estudou o segundo grau noturno, em um curso profissionalizante (Técnico em Contabilidade), era notório o despreparo para enfrentar a maratona do concurso vestibular. Mas eram comum aos estudantes do segundo grau, turno da tarde, do Cientifico e Acadêmico (posteriormente passou a ser chamado de Ensino Médio e atualmente é chamado de Segundo Grau) serem aprovados, no vestibular, na primeira tentativa. Nesta época os estudantes das escolas públicas garantiam a grande maioria das vagas na universidade.

Neste mesmo período, eu e minha mãe trabalhávamos vendendo roupas nas feiras de Itabaiana, nas feiras das cidades próximas (Carira e Areia Branca) e não preciso dizer que era apenas um meio de sobrevivência. Vendíamos em quatro feiras e por ocasião do início das aulas, na universidade, passei a vender em apenas duas feiras semanais (no sábado em Itabaiana e aos domingos em Areia Branca) e consequentemente passei a ter menos dinheiro no bolso.

Na universidade estranhei o fato de encontrar muitos conterrâneos! Somente na minha turma (Curso de Licenciatura Plena - Geografia), primeiro período, eu encontrei 16 conhecidos. O que mais me chamou a atenção não foi o número de conterrâneos existentes e sim o questionamento por parte desses mesmos conterrâneos: o que você está fazendo aqui? Escutei essa pergunta por uma centena de vezes durante os dois primeiros semestres que estudei na Universidade (UFS).

Com a criação das cotas, para negros e para alunos oriundos das chamadas Escolas Públicas, certamente o número de estudantes oriundos das classes sociais economicamente menos abastadas se tornaram bem maiores. Será que os que não entraram pelas cotas estão a repetir a infeliz pergunta: o que vocês estão fazendo aqui?

Antônio Carlos Vieira
Licenciatura Plena - Geografia (UFS)

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